
"Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir" (Livro do desassossego - pag. 50 - Fernando Pessoa)
Após lembrar essa citação,achei que o alívio pra meu coração seria isto mesmo, escrever pra diminuir a febre de sentir.
Lembrei que havia abandonado meu blog e quem sabe essa seria a hora de retomar meu blá,blá,blá...
Fui assaltada com direito a revólver na cara por causa de um celular e 100,00 reais...
Por um rapaz de uns 20 anos, pouco maior que eu,de camisa vermelha
que aprendeu a usar a mão pra segurar uma arma e não uma caneta,
que aprendeu a usar a mão para matar e não para ajudar quem precisa,
que aprendeu a fazer da própria estupidez o fermento para mais violência
que prefere disseminar o medo a esperança...
É tudo muito louco pq é tão rápido mas ao mesmo tempo passa tanta coisa na tua cabeça...Achei, sinceramente que iria dar meu último suspiro naquele momento. Senti menos que medo e mais que desespero num instante vazio de qualquer reação. Estive sob a mira de uma arma a poucos centímetros de mim esenti a incômoda sensação da impotência, da insegurança, da fragilidade da vida. Senti saudade dos meus filhos, medo de perdê-los e uma enorme agonia de pensar no que eles sentiriam ao saber que sua mãe fora morta por alguém que talvez não saiba o que é viver.
Ao ouvir aquele elemento com um olhar ensandecido falando: " PASSA O CELULAR,DINHEIRO, PASSA TUDO QUIETINHA SENÃO VOU ATIRAR!" fui tomada por uma sensação que n conhecia: a sensação de não ser nada.
Falo para os meus filhos da importância de se praticar um esporte, de tocar um instrumento musical, de se fazer amigos, de ajudar, de jogar o lixo no lugar certo etc. e todo esse ensinamento ficou menor diante do fato de que tudo isso pode ser desintegrado na desesperança de um ato covarde, torpe, ignorante que tem como causa principal a grande banalidade em que se transformou a nossa vida.
Governantes não governam, polícia não policia, escola não ensina, leis não se aplicam... tudo isso sujacente à ditadura dos discursos vazios, da desídia e da pusilanimidade que faz com que o bom seja fortuito, que o bem seja provisório e que o mal faça de nosso caminho uma constante gincana, uma roleta russa...
Os jornais noticiam a bala perdida com um lamentável tom de tragédia. Como se disséssemos "QUE AZAR", ou como se disséssemos "também, quem mandou estar naquele lugar naquela hora?".
De fato, nunca pensei que isso fosse acontecer, e com certeza já aconteceu de maneira muito pior com outras pessoas. Eu podia ter agido diferente, é o que eu mais penso, mas aconteceu e não tem como voltar atrás. E como já disse, se foi ruim desse jeito para mim, que na verdade saí inteira da história, imagine o que não sente quem é torturado, estuprada…assim….de graça? Não é nada boa a sensação de ter pessoa apontando uma arma pra você...
Aprendi uma frase com a minha mãe:"Você pode perder tudo o que tem,menos o que aprendeu e viveu" E aqui estou eu, lisa, sem comunicação via celular e desabafando, ao mesmo tempo lembrando de tantas experiências que passei, boas, ruins, todos os amigos, as viagens, os livros, as músicas que fazem parte da minha vida, coisas que posso ainda perder ou adquirir... Vou aprender a ser mais cuidadosa,não só pelo fato do assalto, mas comigo mesma,talvez esse seja o grande recado disso tudo a luz amarela acendeu... E eu talvez tenha finalmente enxergado...